sábado, 9 de abril de 2011

FRASES CLARICEANAS

Clarice Lispector

Selecionei pessoalmente algumas das mais marcantes frases da obra Clarice Lispector. Escolha também suas frases preferidas e abandone-se ao universo de Clarice.

Frases do livro “Um sopro de vida” ou “Pulsações”

  • Eu escrevo como se fosse para salvar a vida de alguém. (pág. 11)

  • Eu não faço literatura: eu apenas vivo ao correr do tempo. O resultado fatal de eu viver é o ato de escrever. (pág. 15)

  • Vida não tem adjetivo. (pág. 19)

  • O que sinto não é traduzível. Eu me expresso melhor pelo silêncio.  (pág. 31)

  • Eu sou oblíqua como o voo dos pássaros. (pág. 34)

  • Para escrever eu antes me despojo das palavras. Prefiro as palavras pobres.(pág. 39)

  • Quando chover quero que caia sobre mim, abundantemente. Abrirei a janela de meu quarto e receberei nua a água do céu.  (51)

  • O futuro é um pássaro que ainda não se realizou. (pág. 50)

  • A mais bela música do mundo é o silêncio interestrelar. (pág. 64)

  • O que me mata é o cotidiano. Eu queria só exceções. Estou perdida: eu não tenho hábitos. (pág. 66)

  • Sou um mendigo de barba cheia de piolhos sentado na calçada da rua chorando.  (pág. 89)

  • A palavra é um dejeto do pensamento. Cintila. (pág. 93)

  • Cada livro é sangue, é pus, é excremento, é coração retalhado, e nervos fragmentados, é choque elétrico, e sangue coagulado escorrendo como lava fervendo pela montanha abaixo. (pág. 93)

  • Me coisificam quando me chama de escritor. Nunca fui e nunca serei. Recuso-me a ter papel de escriba no mundo. (pág. 94)

  • Escrever __ eu arranco as coisas de mim aos pedaços como o arpão fisga a baleia e lhe estraçalha a carne... (pág. 99)

  • A morte é o perigo constante da vida. (pág. 157)

  • ...O perigo é o que torna preciosa a vida (pág. 157)

  • Não pense que escrevo aqui o meu mais íntimo segredo pois há segredos que eu não conto nem a mim mesma. (pág. 158)

  • A manhã é uma flor prematura. (pág. 160)

  • Era um dia um homem que andou, andou e andou e parou e bebeu água gelada de uma fonte. Então sentou-se numa pedra e repousou o seu cajado. Esse homem era eu. E Deus estava em paz. (pág. 161)

  • Cada livro é uma viagem. Só que é uma viagem de olhos vendados em mares nunca dantes navegados __ a mordaça nos olhos, o terror da escuridão é total.  (pág. 15)

  • Viver é um ato que não premeditei. Brotei das trevas. (pág. 34)

  • Eu sou um ser privilegiado porque sou a única no mundo. Eu enovelada de eu. (pág. 47)

  • O milagre é o riquíssimo girassol se explodir de caule, corola e raiz __ e ser apenas uma semente. (pág. 47)

  • O silêncio não é o vazio, é a plenitude. (pág. 53)

  • A diferença entre o doido e o não-doido é que não-doido não diz nem faz as coisas que pensa. (pág. 52)

  • Mentira também é uma verdade, só que sonsa e meio nervosa. (pág. 61)

Frases do livro A paixão segundo G.H

  • Eu sou mansa mas minha função de viver é feroz. (pág. 112)

  • Provação: significa que a vida está me provando. Mas provação: significa que eu também estou provando. E provar pode se transformar numa sede cada vez mais insaciável. (pág. 125)

  • Eu procurava o mais orgíaco de mim mesma. (pág. 123)


Frases do livro Água viva

  • Quero captar o meu é.  (pág. 10)

  • Sou um ser concomitante: reúno em mim o tempo passado, o presente e o futuro, o tempo que lateja no tique-taque dos relógios. (pág. 22)

  • Não é um recado de ideias que te transmito e sim uma instintiva volúpia daquilo que está escondido na natureza e que adivinho. (pág. 24)

  • O meu principal está sempre escondido. Sou implícita. E quando vou me explicitar perco a úmida intimidade. (pág. 25)

  • Escrevo-te porque não me entendo. (pág. 28)

  • Mas a palavra mais importante da língua tem uma única letra: é. É. (pág. 28)

  • A prece profunda é uma meditação sobre o nada. (pág. 31)

  • Sou um coração batendo no mundo. (pág. 37)

  • Que estou fazendo ao te escrever? Estou tentando fotografar o perfume. (pág. 55)

  • Ah viver é tão desconfortável. Tudo aperta: o corpo exige, o espírito não para, viver parece ter sono e não poder dormir __ viver é incômodo. Não se pode andar nu nem de corpo nem de espírito. (pág. 96)

  • Tudo acaba mas o que eu te escrevo continua. (pág. 96)

  • Caminho segurando um guarda-chuva aberto sobre corda tensa. Caminho até o limite do meu sonho grande. (pág. 29)

  • Não gosto quando pingam lima nas minhas profundezas e fazem com que eu me contorça toda. (pág. 31)

  • Sou caleidoscópica; fascinam-me as minhas mutações faiscantes eu aqui caleidoscopicamente registro. (pág. 34)

  • Eis que te faço perguntas e muitas estas serão. Porque sou uma pergunta. (pág. 40)

  • Estou sentindo o martírio de uma inoportuna sensualidade. De madrugada acordo cheia de frutos. (pág. 39)


Frases de Perto do coração selvagem

  • ...de qualquer luta ou descanso acordarei forte e bela como um cavalo novo. (pág. 202)

  • O mistério explica mais que a claridade. (pág. 188)

REFERÊNCIAS

LISPECTOR, Clarice. Água viva. 5. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira,1980.

LISPECTOR, Clarice. A paixão segundo G.H. 10. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986

LISPECTOR, Clarice. Perto do Coração Selvagem. Rio de Janeiro: Rocco, 1998.

LISPECTOR, Clarice. Um sopro de Vida. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1978.



POEMAS EM HOMENAGEM À CLARICE LISPECTOR

Ferreira Gullar fez o poema abaixo em homenagem à Clarice Lispector, quando ela faleceu.

Enquanto te enterravam no cemitério judeu
do Caju
(e o clarão de teu olhar soterrado
resistindo ainda)
o táxi corria comigo à borda da Lagoa
na direção de Botafogo
as pedras e as nuvens e as árvores
no vento
mostravam alegremente
que não dependem de nós
("Na Vertigem do Dia", do livro "Toda Poesia", de 1980)

Veja o depoimento do poeta:

"Esse poema foi escrito no em dia que Clarice morreu. Estava em casa, me preparando para viajar para São Paulo, quando tocou o telefone, dizendo que ela tinha acabado de morrer. Fiquei chocado porque tinha tentado ir visitá-la no hospital. E ela me mandara um recado para que eu aguardasse e voltasse depois. Achei estranho porque a informação era a de que era duvidoso que ela voltasse para casa, já que seu estado era grave. Pouco depois, recebi a notícia de sua morte. O carro que me pegou para levar ao aeroporto foi pela lagoa Rodrigo de Freitas. Estava um dia lindo: sol e árvores balançando com a brisa. Achei chocante, um contraste. Eu triste com a morte dela e a natureza pouco ligando. (ri) O poema é isto: enquanto morremos, a natureza não tem nada a ver conosco. Ela está na dela."                  

( Revista Bravo; outubro de 2010)

Poema de Carlos Drummond de Andrade para Clarice Lispector:

Visão de Clarice Lispector
Clarice,
veio de um mistério, partiu para outro.
Ficamos sem saber a essência do mistério.
Ou o mistério não era essencial,
era Clarice viajando nele.
Era Clarice bulindo no fundo mais fundo,
onde a palavra parece encontrar
sua razão de ser, e retratar o homem.
O que Clarice disse, o que Clarice
viveu por nós em forma de história
em forma de sonho de história
em forma de sonho de sonho de história
(no meio havia uma barata
ou um anjo?)
não sabemos repetir nem inventar.
São coisas, são jóias particulares de Clarice
que usamos de empréstimo, ela dona de tudo.
Clarice não foi um lugar-comum,
carteira de identidade, retrato.
De Chirico a pintou? Pois sim.
O mais puro retrato de Clarice
só se pode encontrá-lo atrás da nuvem
que o avião cortou, não se percebe mais.
De Clarice guardamos gestos. Gestos,
tentativas de Clarice sair de Clarice
para ser igual a nós todos
em cortesia, cuidados, providências.
Clarice não saiu, mesmo sorrindo.
Dentro dela
o que havia de salões, escadarias,
tetos fosforescentes, longas estepes,
zimbórios, pontes do Recife em bruma envoltas,
formava um país, o país onde Clarice
vivia, só e ardente, construindo fábulas.
Não podíamos reter Clarice em nosso chão
salpicado de compromissos. Os papéis,
os cumprimentos falavam em agora,
edições, possíveis coquetéis
à beira do abismo.
Levitando acima do abismo Clarice riscava
um sulco rubro e cinza no ar e fascinava.
Fascinava-nos, apenas.
Deixamos para compreendê-la mais tarde.
Mais tarde, um dia... saberemos amar Clarice.
Carlos Drummond de Andrade.





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