Jô Soares entrevista Beth Goulart - 16/09/2010
Trecho no qual  Beth fala sobre Clarice Lispector.  
Jô: E a Clarice, como pintou na sua vida?
Beth: A Clarice tá na minha vida desde a adolescência. Eu sou admiradora profunda de Clarice. E ela veio me acompanhando, e eu a ela durante muito tempo, até que um determinado momento eu falei "ah, eu queria fazer alguma sobre ela". Eu li um livro muito interessante. Era a correspondência da Clarice Lispector com o Fernando Sabino, Cartas do coração, nao sei se você já leu esse livro. 
Jô: não, não li não. 
Beth: Quando eu li, eu disse, nossa, daria um espetáculo tão bonito, tão bacana, dois autores tão interesantes, tão diferentes e, ao mesmo tempo, tão ... (procurando a palavra) interessantes. Aí quis fazer uma adaptação deste trabalho, deste livro. Ali eu comecei a ver a Clarice como personagem. Porque até então eu não sabia exatamente o que eu queria fazer da Clarice. Sabia que alguma coisa em algum momento eu iria fazer. mas não sabia exatamente o que. E ai falei não, dá um espetáculo interessante. Comecei a trabalhar, pesquisar, a estudar sobre isso. Durante o processo não foi possível fazer esse trabalho mas ali eu vislumbrei a Clarice como personagem e ali eu assumi um compromisso de certa maneira com ela. De poder chegar um pouquinho perto dela, trazê-la um pouco pro teatro, pra chegar perto das pessoas, criar uma ponte humana entre ela, sua obra e o público. As pessoas acham que a Clarice é uma coisa meio inatingível, né, uma áurea de mistério. Muita gente (fala): ‘ai mas ela tão difícil’ e eu não achava. Nunca achei ela difícil. 
Jô: não, difícil não, é porque ela se transformou num mito, inclusive porque você falou em Fernando Sabino ; é toda uma geração que ficou fascinada pela Clarice. Aliás, inclusive no sentido de ela ser mulher e escrever como homem. Antigamente tinha muito isso. 
Beth: você sabe que Clarice é a escritora com mais teses pelo mundo. Então o mundo inteiro fica interessado em conhecer Clarice. 
Jô:  E eu acho que isso, que é uma coisa quase que machista, todos eles se identificavam com a maneira de escrever dela. O que não era exclusividade deles, porque todo o mundo, o mundo inteiro tem fascínio pela Clarice. Eu entrevistei aqui uma cantora americana  que fala português (cita o nome) e ela falou que uma das primeiras leituras dela em português era Clarice. Então é um fascínio mundial.
Beth: Ela realmente é fascinante mesmo.
Jô: Como é a história do sotaque?
Beth: Ah, é engraçado. Muita gente acha que ela tem um sotaque estrangeiro, mas na verdade o sotaque da Clarice é do nordeste, né, do Recife. Ela tem uma cantada, um jeito de falar assim meio cantadinho, né. (Começa a imitar o sotaque de Clarice) Vai falando assim, só que quando você coloca a língua presa, parece de um outro lugar, quase um outro país. Na verdade não é. É nordestino. 
Jô: Nordestino com a língua presa. Fala um trechinho pra gente. 
Beth: Ela fala assim: "Escrevo porque encontro nisso um prazer, que não sei traduzir. Não sou pretensiosa." É uma coisa meio assim.
Jô: Uma entonação meio francesa. 
Beth: É uma cantadinha. Mas cantadinha, que é bonitinha, é uma cantadinha nordestina. O r é que da essa misturadinha que parece de outro país. 
Jô: Até que ponto influencia na vida da Clarice o fato de ela uma mulher bonita, uma mulher interessante? 
Beth: Ah, eu acho que influencia muito, ela era muito vaidosa. Toda mulher vaidosa, assim..(sic)  tem um momento do espetáculo que eu faço uma entrevista que ela diz assim, ‘ah a minha vaidade não é literária não, eu não ligo, mas eu gosto que me achem bonita’. Isso, toda mulher de certa maneira tem esse prazer.
Jô: Claro, né, evidente. E quando você começa elogiando a beleza, falam  ‘não, mas não é só isso’.  
Beth: É (sorrindo). 
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Assista a entrevista no you tube. 
Autora do blog: Belinha. 
 
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